5- Os Instrumentos Musicais.
Entre os instrumentos musicais encontrados nas tribos brasileiras, é possível perceber-se um “espírito” em comum: a natureza. Os instrumentos têm por base elementos colhidos na floresta ou destinados a reproduzir os sons da mata. Desta forma predominam instrumentos de percussão e de sopro (flautas e apitos) além, é claro, de vozes.
Uma relação básica dos instrumentos utilizados pelos índios brasileiros contaria com, pelo menos, os citados a seguir, classificados conforme a proposta de Mahillon, bastante adequada aos trabalhos de etnografia. É importante realçar que os nomes podem variar de tribo para tribo, os nomes adotados são os indicados pela bibliografia existente.
Aqueles que vibram por si mesmo ou por percussão, podem ser tocados diretamente ou soarem em decorrência de movimentos indiretos.
Torokaná (trocano, trocana) é um instrumento de sinal conhecido em diversas tribos e grupos primitivos, serve para a comunicação entre pontos distantes. Geralmente é uma tora de madeira escavada a fogo, com uns dois ou três metros de comprimento e mais de metro e meio de diâmetro (os tamanhos podem variar), a madeira deve ser leve e sonora, nela são feitos três buracos de uns dez centímetros de diâmetro, reunidos por uma estreita fenda. O torokaná fica dentro de um buraco, suspenso entre quatro paus com tiras de cipó que permitem que ele seja baixado ao fundo ou elevado conforme a distância que se queira atingir com a mensagem, quanto mais no fundo maior o alcance. A percussão é feita com bastões cujas extremidades estão envolvidas em goma elástica ou tiras de couro. Conforme o local que é golpeado, a quantidade de golpes e seu espaçamento é possível informar pequenas frases, as quais podem ser percebidas em um raio de até 10 quilômetros.
Catacá um instrumento de atrito que consiste de dois pedaços de tábua, ou taboca, um dentado e outro não. O som é produzido pelo atrito de um pedaço com o outro, a variação é decorrente da velocidade e da força com que se atritam os dois pedaços. É uma espécie de reco-reco. Este mesmo instrumento pode ser feito também com bambu, como verificado entre alguns indígenas do Pará. Outro instrumento semelhante é criado a partir do casco vazio da tartaruga, podendo ser atritado por bastões ou pela própria mão, quando se utiliza uma espécie de resina para se obter um som próximo do coaxar de sapos.
Chocalhos (Mussurunas-maracás, auáiú, guararás, urucá, butori entre outros) são instrumentos bastante comuns entre as diversas tribos, podem ser utilizados como guizos e atados ao corpo ou manipulados diretamente. Os guizos são feitos de caroços de frutos, unhas e dentes de animais, sementes ou outras coisas consideradas como amuletos, são colocados em cordéis ou dispostos lado a lado, como cintos ou tornozeleiras, produzindo som durante a movimentação da dança. Podem ainda ser atados a bastões. Costumam ter diversos significados místicos, sendo comum a crença em poderes de feitiçaria. Dentre eles, merece destaque especial o Maracá, instrumento nobre que sinaliza o poder espiritual. Há diversas variantes, consistindo às vezes de uma cabaça oca repleta de pedrinhas ou sementes e colocada na extremidade de um pau. Por vezes se apresenta com dois cabos. Pode ser enfeitado com penas ou pinturas, bem como com trançados de palha, com a qual também podem ser confeccionados. Há maracás em que a cabaça é substituída por esferas de madeira ou barro ou ainda: crânios de animais ou humanos. Apesar de servir para puxar a dança, o maracá é, sobretudo, um instrumento mágico usado pelos pagés para trazer os bons espíritos e se defender dos maus.
Bastões de ritmo (Taquara, Tacapú, Karutana, Waranga, etc) um canudo de bambu ou madeira oca de dimensões variadas, podendo ser aberto nas extremidades ou fechado com cera, marca o ritmo ao ser batido no chão acentuando um dos tempos da dança. Parece ser um instrumento preferencialmente feminino. Em algumas tribos são considerados sagrados, sendo guardados em locais reservados. Podem ser encontrados com maracás presos na parte superior, ou mesmo enfeitados com guizos. São desta família, também, os paus de chuva: bastões de ritmo, fechados com sementes que, ao caírem em seu interior, produzem um ruído semelhante à chuva.
Instrumentos que soam pela vibração de uma membrana neles distendida. Instrumentos do tipo do tambor.
São raros entre os indígenas brasileiros e acredita-se que os existentes sejam cópias de tambores europeus, principalmente tambores militares.
Aqueles que soam pela ação do ar no seu interior. Podem ser agitados ou soprados. É a classe mais numerosa entre os instrumentos indígenas brasileiros.
Zumbidores (aidje) soam quando agitados no ar. Consistem de um cabo decorado (pinturas ou plumas) ligado por uma corda a uma pequena tábua oval. Ao ser girada rapidamente a pequena tábua começa a produzir um zumbido forte. Em muitas tribos tem relação direta com a morte, utilizados em cerimônias funerárias e proibidos às mulheres ou crianças. Em outras, porém, serve de brinquedo infantil.
Trombetas (Onfuá, Inúbia,Janubia, Membi-tarará, Ireru) Instrumentos muito comuns entre as diversas tribos brasileiras. Para a confecção, geralmente, utilizam madeiras ocas como a embaúba, o bambu e a taquara. Têm embocadura na extremidade (instrumentos mais antigos) ou na lateral (possivelmente por influência do contato com o europeu ou o africano). Podem ser compostas por duas metades ligadas com cera ou couro. Chegam a ter dois metros de comprimento. Por vezes eram construídas com cabaças em suas extremidades, ou ainda feitas de barro ou osso. Tinham diversas funções, conforme a tribo:
Trombeta de Jurupari utilizada nas festas em homenagem a esta divindade tida como demoníaca pelos jesuítas. Não se trata de um só instrumento, mas de um grupo deles, são tocados aos pares (em geral oito). A trombeta maior tem um som rouco e soturno. Cada trombeta tem um nome específico, em homenagem a um animal. Os relatos existentes citam alguns destes nomes: yasmecerene (jaguar, em tariana); bedebo (pata muda, em cobeua); mocino (grilo, em arapazo); acuti-puru (esquilo, em nenhuengatu); tipi (paca, em baniua); canaroarro (saúva, em manáu) e dasmae (rola, em aroaqui).
Buzinas de Conchas utilizadas como trombetas de guerra ou sinaleiros nos barcos. São feitas de conchas ou búzios furados em uma extremidade de forma a servir de bocal, produzem som ao serem assopradas.
Trombetas com lingüetas (Paari, Toré, Ufuá) trombetas que dispõem de uma lingüeta de percussão. Podem ser feitas de chifres com lingüetas de bambu. O Toré, por exemplo, é feito de casca de madeira, pele de jacaré ou barro. São instrumentos ligados, geralmente, a alegria. Toré é uma corruptela de Tori, que significa alegria em Tupi.
Figura 6
Flautas de diversas tribos:
Simples e transversais (Tukurina e Kaxinawa)
Nasais (Nambikuara)
Tríplice (Gaviões)
De Pã (Tukano)
Flautas o instrumento predileto dos índios brasileiros. Caracterizam-se pela emissão sonora decorrente do sopro que faz vibrar o ar no interior de um tubo cilíndrico ou mesmo em formato de concha. Predominavam as flautas verticais, mas também eram utilizadas embocaduras laterais e mesmo nasais. Podiam ser construídas de madeira, osso ou barro. São conhecidos casos de flautas que devem ser tocadas por várias pessoas ao mesmo tempo. Neste grupo incluem-se os apitos e os pios. Podiam ser feitos de coco, de folha de palmeira, de chifre, de concha, casca de caracol, madeira etc. Serviam principalmente para a caça e imitavam pássaros.
Figura 7
Pios que imitam os cantos de diversos pássaros
É curiosa ainda a ocorrência da flauta de pan. Trata-se de um conjunto de tubos nos quais a coluna de ar é vibrada pelo sopro feito na parte superior. Sobre este instrumento foram feitos alguns estudos bastante aprofundados, percebendo-se que eram construídos de forma a comporem acordes musicais básicos.
A verificação da presença de acordes nas flautas de pan utilizadas pelos índios brasileiros revela, pelo menos, o conhecimento indígena (pelo menos intuitivo) das escalas musicais. Tal conhecimento, aliado à variedade de recursos sonoros existentes em seus instrumentos, permite a visualização da riqueza musical destes povos.
Figura 8
Flauta-máscara
Wayana, Pará
Museu Paraense Emilio Goeldi
Prosseguir
![]() |